Saúde e tecnologia: pontos de atenção para 2021
Escrito por
Luiza Brandão (Ver todos os posts desta autoria)
11 de janeiro de 2021
“Saúde” foi uma constante dos votos para 2021. Pensar nas interfaces tecnológicas e nas problemáticas de seu emprego no campo da saúde é um dos pontos de atenção para os desdobramentos desse ano.
Saúde pra dar e vender
O uso de tecnologias que aplicam a internet no campo da saúde foram potencializados pela pandemia do covid-19. Apesar de certo entusiasmo com que aplicações, dispositivos e outros sistemas têm circulado, há pontos ainda sensíveis ao emprego dessas – assim chamadas – soluções. Um deles é a nítida desigualdade do acesso e apropriação de tecnologias para a saúde na sociedade. Como em tantos outros campos, aqui também as barreiras sociais, econômicas e digitais estão presentes e se fazem sentir, para muito além das propostas tecnológicas.
Outro ponto para se considerar é que a aplicação de tecnologias ao campo da saúde é também mercadológica. E isso não exclui aquelas tecnologias gratuitas, mas que recebem outras formas de contraprestação – mediante o tratamento de dados pessoais, por exemplo. Nesse aspecto, a “venda” da saúde, em seus aspectos físicos e mentais, implica questões de privacidade e proteção de dados pessoais, segurança da informação e discriminação.
A sensibilidade de dados relativos à saúde
Nunca é demais lembrar: dados pessoais relativos à saúde são sensíveis. Ainda que a sensibilidade de um dado pessoal – aquele que identifica ou pode identificar uma pessoa natural – seja compreendida em determinado contexto, a proteção aos aspectos sobre nossa saúde deve ter um nível ainda maior. Existem riscos mais elevados de discriminação e outros prejuízos no tratamento de dados pessoais de saúde, inclusive no que se refere ao acesso a tratamentos para doenças ou à contratação de seguros de saúde ou de vida. A vigilância massiva sobre dados de saúde recai sobre nossos aspectos mais íntimos e que carregamos literalmente no DNA, por toda a vida.
O emprego de dados de saúde em tomadas de decisão por algoritmos pode ter consequências graves, como a de priorizar pessoas brancas em detrimento dos demais grupos étnico-raciais. Assim, o tratamento de dados relativos à saúde, além de não poder assumir o risco da banalização, exige, desde a concepção até o emprego, compromissos sistêmicos e efetivos, bem como antirracistas.
O futuro requer atenção
As iniciativas que envolvem tecnologia e saúde não necessariamente fazem mal a ela. Alguns exemplos são apresentados no relatório “Boas intenções, más invenções”, que aborda mitos e elenca evidências sobre como esses dois campos podem andar juntos. Para tanto, diferentes setores devem assumir suas responsabilidades e evitar que o solucionismo tecnológico coloque a saúde dos usuários dessas tecnologias em risco, ainda que a intenção seja diferente.
Um ano difícil como 2020, que inaugurou distintas preocupações, chamou atenção para a forma como nós encaramos a saúde. Isso precisa acompanhar os debates sobre a implementação, expansão e capilarização de ferramentas voltadas para esse aspecto da vida dos usuários da internet, suas aplicações e serviços. A discussão sobre o alcance e os efeitos dessas iniciativas precisa amadurecer e considerar, de forma integrada, os riscos para a privacidade e discriminação decorrentes do seu emprego, para que possam efetivamente fazer bem à nossa saúde e ao futuro, que já começou.
* Os pontos de vista e opiniões expressos nesta postagem do blog são de responsabilidade do autor. As opiniões e perspectivas retratadas neste artigo pertencem a seu autor e não necessariamente refletem as políticas e posicionamentos oficiais do Instituto de Referência em Internet e Sociedade.
Ilustração por Freepik Stories
Escrito por
Luiza Brandão (Ver todos os posts desta autoria)
Fundadora e Diretora do Instituto de Referência em Internet e Sociedade, é mestre e bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Fundadora do Grupo de Estudos em Internet, Inovação e Propriedade Intelectual – GNet (2015). Fellow da Escola de Verão em Direito e Internet da Universidade de Genebra (2017), da ISOC – Internet and Society (2019) e da EuroSSIG – Escola Europeia em Governança da Internet (2019). Interessa-se pelas áreas de Direito Internacional Privado, Governança da Internet, Jurisdição e direitos fundamentais.