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#Eleições2024: como fica a propaganda eleitoral no contexto digital brasileiro?

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16 de janeiro de 2024

Em meio à falta da reforma eleitoral em 2023, o TSE reage ao contexto digital desinformativo visando proteger a qualidade democrática do pleito de 2024. Conheça alguns pontos essenciais na minuta atual da resolução sobre propaganda eleitoral. #Eleições2024

A tão esperada reforma eleitoral não saiu em 2023. Tampouco o PL 2630/20. Diante de um contexto digital desinformativo, concentrado economicamente e de usuários com competências digitais limitadas, o Tribunal Superior Eleitoral – TSE tem se movimentado para conter danos à qualidade democrática nas #Eleições2024. Esse post resume alguns pontos de uma das mais importantes movimentações do Tribunal: a resolução sobre propaganda eleitoral. 

Resumo da proposta de resolução aplicada a propaganda eleitoral para 2024:

  1. Transparência nos gastos deve ser elemento observado na pré-campanha
  2. Provedores de aplicações devem oferecer ferramentas de transparência de impulsionamento na pré-campanha
  3. Toda tecnologia digital utilizada para produzir conteúdo político-eleitoral profissional deve ser informada ao cidadão. Não está nítido se a sanção é detenção ou multa.
  4. Classificação de conteúdos por agências de verificação de fatos pode ser usado como parâmetro ao dever de cuidado dos provedores de aplicações
  5. Toda tecnologia digital utilizada para produzir propaganda eleitoral deve ser informada, a sanção é detenção ou multa.
  6. Provedores de aplicações devem tomar providências em relação a conteúdo desinformativo após notificação (não restringe a notificação judicial).
  7. Provedor de aplicação deve publicizar as medidas adotadas para impedir a circulação de conteúdo ilícito que impacte as eleições.

Exigência de mais transparência

Na minuta apresentada pelo TSE em 04 de janeiro de 2024, é proposto a inclusão de transparência nos gastos como um parâmetro a ser observado no impulsionamento de conteúdo político-eleitoral durante a pré-campanha (art. 3-B). Diversas pesquisas do IRIS, como o livro publicado em 2021 “Transparência na moderação de conteúdo: tendências regulatórias nacionais”, apontam que transparência é um dos elementos essenciais para empoderar usuário e outros atores que fiscalizam a atuação das plataformas e de candidatos (como a sociedade civil e a própria justiça eleitoral). Assim, abusos e violações podem ser contidas ou até evitadas. 

Considerando que a pré-campanha é um período muito mais longo que o próprio pleito, que vai de 16 de agosto a 27 de outubro, e um período central para as candidaturas construírem apoio político e a confiança do eleitor, é essencial que salvaguardas sejam também aplicadas ao período de pré-campanha.

A minuta do TSE também exige que os provedores de aplicação disponibilizem ferramentas de transparência da publicidade do conteúdo político-eleitoral durante a pré-campanha (art. 3-B, parágrafo único). Cada plataforma de rede social (que são provedores de aplicação) tem seu tipo de ferramenta de publicização de conteúdo eleitoral. 

Um ponto que ainda não está nítido na minuta do TSE é o art. 3-C, que exige que todo conteúdo profissional que usa tecnologia digital deve ser indicado como tal. Uma interpretação literal do dispositivo demanda que até quem usa aplicativos de edição básica de vídeo, como o famoso CapCut, tenha que mencionar esse uso. 

Muitas pessoas que produzem conteúdo para redes sociais de forma profissional não estão em grandes corporações, agências de publicidade ou de marketing político. Exigir que todo o uso de TICs seja informado pode ser uma obrigação excessiva e de baixa eficácia. Afinal, pela redação do artigo mencionado, qualquer usuário que publicar conteúdo político-eleitoral feito de forma profissional durante a pré-campanha deve informar as TICs utilizadas para produzir o conteúdo. 

A proposta do art. 3-C faz remissão ao art. 9-B, o qual dispõe sobre propaganda eleitoral e estabelece a sanção de detenção de dois meses a um ano, ou pagamento de 120 a 150 dias-multa para quem não informar as tecnologias digitais utilizadas. Não está nítido na redação do dispositivo 3-C se a remissão ao 9-B também estende a aplicação da sanção contida no 9-B

É importante destacar que conteúdo político-eleitoral é uma categoria bem mais ampla e que contém a propaganda eleitoral

  • 🧑‍🤝‍🧑 Ato de propaganda eleitoral: aquele que leva ao conhecimento geral, ainda que de forma dissimulada, a candidatura (mesmo que apenas postulada), a ação política que se pretende desenvolver ou as razões que induzam a concluir que o beneficiário é o mais apto ao exercício de função pública (Acórdão nº 16.183, de 17.2.2000, rel. Min. Eduardo Alckmin)
  • Destacamos que, conforme disposto no art. 3º, V da Resolução Nº 23.610, de 18 de dezembro 2019, não é considerado propaganda eleitoral antecipada
  • 🧑‍🤝‍🧑 A divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive em redes sociais, blogs, sítios eletrônicos pessoais e aplicativos (apps)

Impulsionamento de conteúdo eleitoral.

Conforme dispõe a minuta do TSE em seu art. 29, §12:

  • 🧑‍🤝‍🧑 É vedada a comercialização por provedor de aplicação de qualquer modalidade de impulsionamento de conteúdo que veicule fato sabidamente inverídico ou gravemente descontextualizado que atinja a integridade eleitoral.

Ou seja, acertadamente o Tribunal exige que os provedores de aplicação que queiram ofertar o serviço de impulsionamento de conteúdo tenham processos e ferramentas para verificação da veracidade daquele conteúdo. Essa obrigação é muito distinta da obrigação geral de monitoramento proativo, pois se restringe apenas ao conteúdo impulsionado dentro da plataforma, ou seja, apenas ao conteúdo que envolve direcionamento de recursos e que é contratado pela conta oficial de pessoas candidatas cadastradas no site do TSE. Existem duas diferenças entre exigir que provedores de aplicações garantam a veracidade de conteúdos políticos em geral e conteúdos políticos impulsionados:

  • A quantidade de conteúdos. Por ter menos conteúdos impulsionados do que conteúdos postados gratuitamente na rede, a moderação e análise da veracidade praticada pelas plataformas pode ser mais apurada e atenta aos contextos locais.
  • O propósito do conteúdo. A pessoa usuária que contrata o serviço de impulsionamento de conteúdo tem o objetivo direto de promover candidato ou partido. Assim, não há que se falar em dúvidas sobre o caráter de propaganda eleitoral do conteúdo

Ainda assim, caso algum conteúdo impulsionado seja desinformativo, a minuta do art. 9-B, §3º, exige que o provedor de aplicação responsável pela plataforma, após ser notificado, tome providências para a apuração e indisponibilização do conteúdo. 

Além disso, a minuta não propõe nenhuma sanção ao descumprimento da comercialização de modalidade de impulsionamento eleitoral que não esteja acompanhada de instrumentos para garantia de um conteúdo verídico, tampouco para quando o provedor de aplicação não toma providências após a notificação do conteúdo desinformativo.

Um último ponto a ser destacado é o estímulo aos provedores de aplicação para firmarem  parcerias com agências de checagem O art. 9º, parágrafo único dispõe que a classificação de agências de checagem que tem parceria com o TSE podem ser utilizadas como parâmetro de dever de cuidado. Dever de cuidado é um dos grandes “medos” da regulação de plataformas por ser um termo por vezes abrangente e impreciso que gera certa insegurança jurídica. Na medida que o TSE traz um novo parâmetro para esse dever, também o confere maior objetividade e possibilita que empresas e atores envolvidos tenham maior nitidez sobre adequação à obrigação.

Próximos caminhos da resolução

Você pode participar da construção da resolução sobre propaganda eleitoral que será aplicada nas eleições de 2024! Até dia 19 de janeiro o TSE receberá comentários à minuta e pedidos para participação em audiências públicas. Se você se interessou pelo tema da atuação das plataformas digitais nas eleições, confira nosso projeto sobre Devido Processo na Moderação de Conteúdo.

As opiniões e perspectivas retratadas neste artigo pertencem a seu autor e não necessariamente refletem as políticas e posicionamentos oficiais do Instituto de Referência em Internet e Sociedade.

Escrito por

Diretora do Instituto de Referência em Internet e Sociedade. Bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Representante do IRIS no Grupo de Trabalho sobre Acesso à Internet e na Força-Tarefa sobre eleições na Coalizão Direito nas Redes (CDR). Membro suplente no Comitê de Defesa dos Usuários dos Serviços de Telecomunicações (CDUST) da ANATEL. Co-autora dos livros “Inclusão digital como política pública: Brasil e América do Sul em perspectiva” (IRIS – 2020) e “Transparência na moderação de conteúdo: Tendências regulatórias nacionais” (IRIS – 2021).

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