Estrutura jurídica de startups – Parte III
Escrito por
Anna Flávia Moreira (Ver todos os posts desta autoria)
30 de maio de 2016
Em uma série de três textos, estamos apresentando aqui os benefícios jurídicos da formalização de startups, por meio do microempreendedor individual, do empresário individual, da EIRELI e das sociedades empresariais. No último texto da série, serão apresentados os benefícios da formalização de startups por meio das Sociedades Empresárias.
É importante destacar que a estrutura de uma empresa é o resultado da definição de três variáveis: o formato jurídico, o porte empresarial e o regime tributário. Em relação ao seu porte, a empresa pode ser Microempresa ou Empresa de Pequeno Porte, mas também pode não ter nenhum enquadramento. Em relação ao regime tributário, ela pode ser enquadrada no Simples Nacional, no Lucro Presumido ou no Lucro Real. Em relação ao formato jurídico, por fim, a empresa pode assumir a forma de Microempreendedor Individual, Empresário Individual, EIRELI, Sociedade Limitada, Sociedade em conta de participação e Sociedade Anônima.
Como demonstrado nos textos anteriores, a estrutura jurídica de uma startup não está definida por um modelo preestabelecido; ou seja, não existe uma receita de bolo para essa definição e cada situação contém suas peculiaridades, como as responsabilidades assumidas por cada sócio, o capital que será integralizado, o modo de execução do negócio, etc. A subjetividade na escolha da participação societária e a falta de um aconselhamento jurídico, portanto, acabam levando a escolhas ruins, que podem comprometer o sucesso do negócio. Por isso, é importante que os empreendedores se antecipem aos problemas e que entendam que a divisão societária é uma etapa inicial bastante relevante para a startup. É preciso analisar antecipadamente, por exemplo, hipóteses como a retirada de um sócio, a contribuição de cada sócio para o negócio, as suas responsabilidades, as alternativas de alienação. Mais importante ainda é que todos os assuntos discutidos sejam formalizados por meio de um instrumento contratual.
Além do Microempreendedor Individual, do Empresário Individual e da EIRELI, também pode interessar às startups a constituição sob os tipos societários sociedade limitada ou sociedade anônima, as denominadas sociedades empresárias, que serão delineadas a seguir.
Sociedade Limitada
A Sociedade Limitada é uma opção simples, flexível e de custo reduzido para quem está começando com outros sócios em qualquer atividade, motivo pelo qual é uma das mais utilizadas por empreendedores. Ela é constituída por meio de um contrato social, instrumento que regula as condições e responsabilidade dos sócios entre si e perante terceiros, e é regida pelo Código Civil, possuindo estrutura menos burocratizada e onerosa se comparada com a Sociedade Anônima. A responsabilidade dos sócios é limitada à integralização do capital social, de modo que as responsabilidades assumidas pela empresa não afetam o patrimônio pessoal do sócio, mas quando um dos sócios não integraliza, todos respondem solidariamente pela correspondente integralização perante terceiros. Por fim, é possível optar pelo Regime de Tributação do Simples Nacional, e é uma boa estrutura para casos em que haja alta concentração das quotas nas mãos de poucos controladores e em que não haja necessidade de recursos de terceiros.
Entre as desvantagens na constituição sob a forma de Sociedade Limitada estão a maior dificuldade na obtenção de investimentos, a responsabilidade solidária dos sócios pela integralização do capital social, a impossibilidade de exclusão de sócios (em regra), a impossibilidade de emitir valores mobiliários, a restrição a diferentes classes de sócios e a obrigatoriedade de a alteração de sócios ser feita por meio de alteração do Contrato Social.
Sociedade Anônima
A Sociedade Anônima de capital fechado é a pessoa jurídica de direito privado formada por dois ou mais acionistas, de natureza empresarial, em que o capital social está dividido em ações de igual valor nominal, podendo ter suas ações negociadas com terceiros alheios a qualquer dos sócios, pois inexiste o relacionamento próximo e de confiança mútua entre eles (affectio societatis). Essa Sociedade restringe a responsabilidade do acionista ao preço de emissão das ações que adquiriu, fator que atrai investidores. A S.A. de capital fechado não pode transacionar ações na bolsa de valores, apenas realizando a venda a terceiros interessados de maneira direta. É nesse ponto que se diferenciam as Sociedades fechadas das abertas, pois as últimas podem realizar a venda de ações na bolsa de valores, desde que devidamente autorizadas pela CVM (Comissão de Valores Imobiliários).
A Sociedade Anônima possibilita a elaboração de acordos de acionistas, emissão de debêntures (forma de financiamento por meio de emissão de títulos de dívida da empresa), abertura de capital ao mercado financeiro, oferece uma estrutura de governança mais robusta (a administração da companhia pode ser composta por uma Diretoria e um Conselho de Administração), existe previsão legal que obriga a distribuição de dividendos mínimos obrigatórios, dentre outras regras aplicáveis a este tipo societário. Apesar de parecer uma opção um pouco mais complexa e mais custosa para quem está começando, pode ser utilizada para qualquer atividade e apresenta diversas vantagens, podendo ser interessante até para um negócio inicial. Mas as obrigações legais são o ponto que mais afasta os empreendedores dessa estrutura para suas empresas. Além disso, existe uma impossibilidade de se enquadrar essas companhias no regime de tributação do Simples Nacional, sendo permitida apenas a opção entre o Lucro Presumido e o Lucro Real.
É constituída por meio de um Estatuto Social, instrumento que regula as condições e responsabilidade dos sócios entre si e perante terceiros, e é regida pela Lei n°. 6.404/76, possuindo uma forma mais estruturada. A Sociedade Anônima possibilita várias operações societárias e facilita a captação de investimento por parte de startups. Para uma startup que adote essa estrutura societária, a Sociedade Anônima começará fechada, podendo obter recursos pelos acionistas e pela emissão de valores mobiliários, como debêntures, por exemplo. Além disso, a S.A permite mais de uma classe de acionistas e não exige a alteração do documento de constituição da sociedade para modificação dos acionistas, ou seja, não é necessária alteração do Estatuto Social.
Sendo assim, a S.A. é interessante para empresas mais consolidadas e estruturadas ou que vislumbrem o ingresso de investidores ou captação de recursos de terceiros, como, por exemplo, startups que já possuem investidores dispostos a aportar recursos na empresa. Contudo, existem desvantagens na constituição sob a forma de Sociedade Anônima que devem ser observadas, como a estrutura mais complexa, regida por lei específica, maiores custos operacionais, como publicações exigidas pela lei, procedimentos e controles internos mais rígidos e a necessidade de cuidados regulatórios, estrutura de cargos de diretoria de forma rígida, com pelo menos dois diretores, integralização do capital por meio de bens dependente de avaliação por peritos, etc.
Conclusões finais
Ao final dessa série de três textos, é possível afirmar com segurança que, para o sucesso de uma startup, não basta apenas uma ideia inovadora e rentável, sendo necessário também o planejamento e a adequação à uma estrutura jurídica compatível com o negócio em desenvolvimento. Não é aconselhável aos empreendedores, portanto, que deixem os aspectos jurídicos em segundo plano, e só mais tarde se preocupem com os prejuízos já causados à startup. É fato que ainda há muita falta de informação por parte de vários empresários, que encerram suas atividades precocemente, e a maior causa dos fechamentos prematuros de empresas é a falta de planejamento adequado dos negócios. Isso acontece porque um grande número de profissionais que atuam em qualquer ramo o fazem informalmente, suportando diretamente todos os riscos da atividade. Diante disso, o empreendedor precisa se utilizar e um plano de negócios – ferramenta de análise da probabilidade de sucesso no mercado – e escolher o formato jurídico que melhor o beneficia, contando com a assessoria de profissionais qualificados ou mesmo com as ferramentas e cursos disponibilizados pelo governo por meio do SEBRAE.