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Ouvidoria Pública e as demandas dos cidadãos: a contribuição do Sistema e-ouv

30 de outubro de 2017

A Lei de Acesso à Informação (LAI), promulgada em 2011 (N°12.527), e o Decreto que institui a Política de Participação Social e o Sistema Nacional de Participação Social de 2014 (N°8.243) colocaram a ouvidoria pública em maior evidência dentro do campo político brasileiro. Afinal, a partir desse momento, maiores responsabilidades foram instituídas e, consequentemente, ampliou-se a expectativa (e as demandas) para que a ouvidoria se configure cada vez mais como um arranjo de controle e participação social; abrigando em alguns casos, inclusive, os serviços de informação ao cidadão (SIC), com vistas a garantir o direito ao acesso à informação.

A ouvidoria pública foi indiretamente fundamentada juridicamente com a Constituição de 1988, em seu artigo 37°, parágrafo 3, que em sua redação original diz: “as reclamações relativas à prestação de serviço público serão disciplinadas em lei”, o que contribuiu para que ela se espalhasse pelo país entre os três poderes.

Porém, outras medidas mais específicas foram vitais para fortalecer o papel das ouvidorias na defesa dos direitos dos cidadãos e melhoria das políticas e serviços públicos. Dois exemplos principais podem ser citados: 1) em setembro de 2013 foi constituído via decreto o Sistema Nacional de Ouvidorias do Poder Executivo Federal, que obriga todos os órgãos de sua estrutura a implantar um a ouvidoria, constituindo, assim, o Sistema e-ouv, um sistema informatizado criado em dezembro de 2014 que dinamiza e integra o fluxo comunicacional entre as diversas ouvidorias que o integram o Sistema e-ouv. Esse sistema foi desenvolvido pela Controladoria Geral da União – CGU; e 2) a instituição via Portaria (n°50.253), em dezembro de 2015, do Programa de Fortalecimento das Ouvidorias (PROFORT), que visa apoiar a criação e desenvolvimento de ouvidorias públicas, bem como o aperfeiçoamento da gestão de processos e atuação integrada das ouvidorias.

O Sistema e-ouv permite integrar melhor o fluxo de demandas e solicitações que chegam as ouvidorias, propiciando uma melhor gestão de manifestações encaminhadas a esses canais. A ideia aqui é de que seria necessário ter uma visão sistêmica de todo o aparato que envolve o funcionamento das ouvidorias públicas, com uma atuação coordenada e em rede entre elas. Por meio desse sistema, por exemplo, é possível realizar uma triagem inicial das manifestações, encaminhando-as posteriormente para o órgão responsável pelo assunto, facilitando para o cidadão, que não precisa ficar indo de órgão em órgão até conseguir registrar sua reclamação ou solicitação. Além disso, a ouvidoria informa para o cidadão para qual órgão a sua manifestação foi encaminhada, o que contribuiu para o processo de educação política.

O principal ponto positivo desse sistema informatizado, além da facilitação e ampliação do acesso às ouvidorias, é que ele consegue diminuir os ruídos e perdas de informações, aperfeiçoando o atendimento ao cidadão, e tudo com maior agilidade de recebimento da manifestação, registro, e formulação da resposta. Somado a isso, o e-ouv permite maior troca de experiências entre os ouvidores e sua equipe, quanto à resolução de conflitos, à resolução de dúvidas de como tratar e analisar determinada manifestação, e até mesmo na definição da linguagem a ser utilizada para a resposta ao cidadão-manifestante.

Outra iniciativa que visa disseminar tal sistema, integrado a política do PROFORT, é o Ouv Municípios, que cede gratuitamente o código fonte do Sistema e-Ouv (uma plataforma web), não requerendo qualquer tipo de instalação ou custo operacional-tecnológico para o ente municipal. A adesão ao Ouv Municípios também é acompanhada de oferta de cursos e treinamentos sobre a atividade da ouvidoria e elaboração/distribuição de material técnico-orientativo. Atualmente 104 municípios já aderiram a esse sistema (estimativa feita em: 20/10/2017).

De acordo com a Controladoria Geral da União (CCGU), houve um aumento em 95% dos registros destinados ao Sistema de Ouvidorias do Poder Executivo (e-ouv) de janeiro a março de 2017, quando comparado com os três primeiros meses de 2016. Esse crescimento se deve à integração do e-OUV com as plataformas operacionais do Reclame Aqui, e com o Portal de Serviços do Governo Federal do Ministério do Planejamento. Em outras palavras, verifica-se que a implementação desse sistema e sua integração para as diversas ouvidorias, propiciou que esse canal se fortalecesse junto ao espaço público, tanto para o cidadão como um espaço para recebimento e “tratamento” das suas demandas, quanto para os gestores como instrumento de condução e avaliação da gestão pública.

Todavia, a questão da prestação de contas ainda precisa ser incrementada perante esse sistema. Não são publicizados os relatórios de sugestões elaboradas pelas ouvidorias no portal da ouvidorias.gov, o que inviabiliza o princípio da justificação pública e do controle social. Ou seja, não se tem informação sobre a sua atuação, o que pode recair no perigo de considerá-la como um canal inerte, responsável somente por receber, encaminhar e responder à mensagem ao cidadão-demandante, e assim, não desenvolver ações propositivas com base na magistratura de persuasão e na mediação de conflitos. Acrescido a esse ponto, a prestação de contas adotada possui uma lógica mais particularista, ou seja, somente para aquele que acionou a ouvidoria e não voltada para a coletividade dos cidadãos (público externo). Enfim, não há uma política mais ampliada de comunicação e de interação com os cidadãos para a ouvidoria pública.

Todavia, os aspectos levantados no parágrafo acima envolvem relações de poder, e referem-se a conceitos de autonomia política e técnica, que na nossa percepção fogem do escopo principal desse artigo, e, portanto, (quem sabe?) podem ficar para um próximo post.

As opiniões e perspectivas retratadas neste artigo pertencem a seus autores e não necessariamente refletem as políticas e posicionamentos oficiais do Instituto de Referência em Internet e Sociedade.

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