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Saúde mental nas redes sociais: o que ansiedade e consumo têm em comum?

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30 de setembro de 2019

Desde 2015 setembro é o mês dedicado à causa da saúde mental e prevenção ao suicídio no Brasil. Quando esse assunto aparece nas dinâmicas da internet, não é raro ver notícias, comentários e até mesmo perceber com o tempo o quanto as redes sociais podem fazer mal quando usadas em excesso. Apesar do “culto à perfeição” nas redes sociais estar sendo mais debatido nos últimos anos, não é apenas essa questão que reflete na saúde mental dos usuários e na forma como consumimos produtos e informação. Confira, a seguir, como o excesso de informação na internet impacta na construção da autoestima e no desenvolvimento de transtornos como a ansiedade.

A internet e a saúde mental não são virtuais

Já parou para pensar que as redes sociais podem não ter esse nome por acaso? Considerando a internet como um desdobramento da nossa sociedade offline, plataformas como o Instagram, Twitter e Facebook trazem para a rede mundial de computadores ambientes de socialização. Esses ambientes permitem que nossas interações em sociedade aconteçam sem impedimentos físicos e em questão de segundos, o que traz para os usuários ― que também são atores sociais ― uma nova forma de se relacionarem consigo mesmos e com o mundo. Com a facilidade de acesso à informação é tão fácil saber sobre o que acontece do outro lado do mundo quanto saber sobre a vida de um amigo próximo, e é nessa facilidade que reside alguns perigos à saúde mental.

Fear of Missing Out – FoMO

Se você ainda não viu, provavelmente ainda vai se deparar com o termo “FoMO” em alguma revista ou portal de notícias. A sigla, que deriva do inglês “Fear of missing out”, foi cunhada pelo Dr. Dan Herman em 2000 e quer dizer “medo de perder algo”. Esse medo é definido como um sentimento de ansiedade no qual você acredita que outras pessoas estão vivendo uma experiência incrível, e você está perdendo esta oportunidade. Ultimamente o FoMO tem sido muito relacionado ao uso excessivo da internet e ao desenvolvimento de problemas de saúde mental como ansiedade e depressão.

Vale ressaltar que o FoMO não é tão recente assim, e muito menos que está relacionado somente às redes sociais. Jenna Wortham aponta que essa sensação de estar perdendo algo existe na história desde que é possível saber sobre a vida de outras pessoas através de um meio de comunicação. Desde uma simples conversa presencial até uma sequência de stories no Instagram, temos informações sobre a vida do outro e, automaticamente, acabamos nos comparando e gerando expectativas a respeito de nós mesmos. Visto que na rede sempre há algo acontecendo, a urgência constante de estar participando de tudo alimenta cada vez mais um sentimento de ansiedade.

FoMO não é apenas sobre estar perdendo algo

Uma pesquisa do Clute Institute indica que o sentimento de estar perdendo algo é composto de outras sensações, como a irritabilidade, ansiedade e inadequação.

Segundo a pesquisa, a irritabilidade e ansiedade são entendidas como comportamentos que refletem um sentimento de inadequação, que por sua vez impacta fortemente a autoestima. Assim, o ato de rolar sua linha do tempo e ver que algum conhecido está vivendo algo incrível faz com que você se questione.

“Por que a minha vida não é tão incrível assim?”

“Por que eu não também não estou vivendo isso?”

Conforme já explicou Solomon no texto “The feeling of inadequacy”, publicado em 1928 na Welfare Magazine, todos estes questionamentos, endereçados de nós para nós mesmos, acarretam em um sentimento de inferioridade. Acabamos nos sentindo inferiores pela imagem de um dia de folga que pode ter sido feita há meses atrás, ou ainda de uma festa que, às vezes, nem foi tão legal quanto a foto que foi postada. 

A autoestima na era dos likes

Além da irritabilidade, ansiedade e inadequação, os níveis de FoMO de um indivíduo também estão ligados diretamente a sua autoestima, que se relaciona diretamente a forma como as pessoas se sentem consigo mesmas. No entanto, pesquisadoras e pesquisadores da área da Psicologia apontam que nem sempre as pessoas avaliam seus sentimentos consigo mesmas de forma consciente, o que é um prato cheio para a ansiedade.

Nos últimos anos o impacto na saúde mental de usuários de redes sociais como o Instagram ― considerado pela Royal Society for Public Health como a rede mais nociva aos jovens ― vem sendo muito discutido. Essas discussões normalmente apontam o conteúdo das postagens como principal causa do problema, já que a exposição em pequenas doses contínuas a fotos e textos que sempre mostram os melhores ângulos e experiências da vida de alguém faz com que os usuários se comparem, questionem a si próprios e desenvolvam o sentimento de inadequação, já explicado anteriormente.

No entanto, não é como se estivéssemos, enquanto checamos as redes sociais, lamentando por não estarmos nos divertindo na praia em plena quinta-feira ou usando aquele look do dia lindo. Por mais que a comparação não aconteça de forma tão literal e direta, ainda assim é inegável que a exposição a este tipo de conteúdo impacte em nossa autoestima.

Segundo DeJong, a autoestima pode ser tanto explícita quanto implícita. Como os próprios termos sugerem, a construção da autoestima explícita acontece quando nos auto avaliamos de forma consciente; enquanto a autoestima implícita é construída quando esse processo acontece de forma inconsciente.

Olhar constantemente o celular durante o dia também significa que estamos nos expondo a muitos conteúdos que nos convidam a uma autoavaliação e comparação ―  ainda que de forma inconsciente. Assim, sem nem mesmo perceber, o hábito de navegar nas redes sociais pode transcender a tela do celular e afetar a forma como enxergamos a nós mesmos.

A ansiedade também movimenta o mercado

O sentimento de estar perdendo algo, para além dos exemplos mais comuns de postagens de amigos que vemos nas redes sociais, também é extremamente útil para o consumo ― tanto de bens materiais quanto de experiências e informação. Já parou para pensar sobre como, às vezes, apenas ver os stories de amigos que foram a um festival de música pode te fazer ficar triste por não estar lá e, provavelmente, querer comprar um ingresso para a próxima edição ― que, não por acaso, pode até estar em pré-venda?

 Estudiosos da área de marketing e vendas apontam que o sentimento de estar perdendo algo influencia diretamente nossas decisões de compra. O impulso do consumo, nesse contexto, está na oportunidade de não perder uma experiência tão boa (ou ainda melhor) do que a vivida por aqueles que nos rodeiam. 

Como tornar a internet mais saudável?

Depois desse texto pode até parecer que as redes sociais só trazem malefícios, mas é importante lembrar que não. A questão é que, com o volume de informação que a internet torna acessível, os processos de comparação com o outro e os possíveis danos à autoestima são intensificados ― o que torna a discussão sobre a responsabilidade do conteúdo que postamos, quem seguimos e como construir uma internet mais saudável cada vez mais importante. Como Luíza Brandão e Anna Célia Carvalho já apontaram no blog do IRIS, saúde mental é uma causa tanto on quanto offline para o ano inteiro.

As opiniões e perspectivas retratadas neste artigo pertencem a seu autor e não necessariamente refletem as políticas e posicionamentos oficiais do Instituto de Referência em Internet e Sociedade.

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Coordenador de comunicação do IRIS, designer e ilustrador freelancer no mercado editorial e publicitário, com foco em criações vibrantes que mesclam natureza, orgulho LGBT+ e surrealismo. Graduado em Publicidade pela UFMG, é coordenador de comunicação no Instituto de Referência Internet e Sociedade, onde atua pela democratização do conhecimento. Também foi membro do programa Youth no IGF2023 no Japão e pesquisador em temas de inclusão digital, autor dos livros “Glossário da Inclusão Digital” e “Inclusão digital como política pública”. Além disso, também é apresentador do podcast “Lascou!”, sobre as dificuldades de artistas on e offline.

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