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Internet e direitos autorais no Brasil

Escrito por

9 de junho de 2016

Letícia Vial e Marcos Henrique Leroy

O estudo da Propriedade Intelectual se divide, de maneira genérica, no em dois grandes grupos:

Propriedade Industrial

tem como objeto obras de caráter utilitário, industrial ou comercial e engloba o estudo das marcas, patentes, dentre outros;

Direitos Autorais

Aos quais daremos maior ênfase por se tratar da série de direitos que gera mais debates quando tratamos da Internet.

O que são os direitos autorais

Direitos autorais são prerrogativas jurídicas que visam a proteger autores (sejam eles pessoas físicas ou jurídicas) em relação as obras intelectuais consideradas criações do espírito humano, marcadas pela originalidade e diferentes formas. Assim, autores gozam de direitos morais e patrimoniais quando suas criações são exploradas, podendo elas ser livros, peças teatrais, músicas, softwares, pinturas, fotografias, etc. A proteção conferida pelo direito autoral ocorre em dois âmbitos de direitos:

Direitos morais

Protegem a relação pessoal existente entre autor e sua obra, refletindo prerrogativas conexas à personalidade dos próprios criadores, sendo inalienáveis e irrenunciáveis. O escopo dessa proteção garante aos autores o direito de ter reconhecida sua autoria sobre a obra, havendo a obrigação de ter seu nome citado quando da reprodução e/ou execução desta. Garante também o direito à manutenção da integridade da criação, podendo rejeitar modificações na obra e proibir sua utilização em contextos que julgue nocivos ao seu trabalho.

Direitos patrimoniais

Garantem o direito dos autores de terem retorno financeiro sobre a obra produzida. Esse âmbito do direito autoral garante o direito exclusivo do autor de utilizar, fruir e dispor de suas próprias criações, podendo assim negociá-las como for conveniente. Autores podem, no exercício desse direito, autorizar ou proibir a reprodução, distribuição, interpretação e execução públicas, radiofusão e comunicação ao público, tradução, adaptação e criação de obras derivadas de suas obras.

O que são direitos conexos?

Os direitos conexos, ou direitos vizinhos, são aqueles derivados do direito autoral, mas que protegem, por sua vez, os direitos daqueles que executam as obras artísticas. São protegidos por esses direitos os intérpretes, executantes, produtores de fonograma e empresas de radiodifusão.

Legislação

No Brasil os dispositivos legais que preveem a proteção dos direitos autorais são:

  • A Lei 9.610/98 conhecida como Lei dos Direitos Autorais (LDA).
  • A Lei 9.609/98 (Lei do Software) que dispõe sobre a proteção do programa de computador;
  • Decreto 75.699/73 (Convenção de Berna) regula a proteção das obras literárias e artísticas;
  • Decreto 57.125/65 (Convenção de Roma) trata dos direitos conexos;
  • Decreto 1.355/94 (TRIPS – Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights) trata sobre aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio.

E o que isso tem a ver com Internet?

Em boa parte do cenário mundial, incluindo o Brasil, a proteção da Propriedade Intelectual é baseada em um sistema construído a partir das perspectivas do século XX, em que as legislações vigentes não preveem inúmeras situações que surgiram somente após a mudança tecnológica trazida pela Internet.

Com a popularização da Internet e dos meios de acesso à informação, a propagação e compartilhamento de materiais protegidos por direitos autorais, como filmes, livros e música ficou muito mais fácil. Em razão da alta velocidade de disseminação sem autorização desses bens, é difícil manter uma proteção ou controle efetivo, sendo comum seu compartilhamento em sites de streaming como YouTube, ou sites que disponibilizam download gratuito.

Para lidar com as novas situações, foram firmados tratados mediante cooperação da comunidade internacional como o Copyright Treaty (WCT) e o WIPO Performances and Phonograms Treaty (WPPT), administrados pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).

O WCT se relaciona com a proteção dos autores de obras literárias e artísticas, como manuscritos e programas de computador; bases de dados originais; obras musicais; obras audiovisuais; obras de arte e fotografias, já o WPPT lida com a proteção dos direitos conexos dos artistas e produtores de fonogramas.

Segundo a OMPI:

O objetivo dos dois tratados é atualizar e completar os principais tratados da OMPI existentes sobre direitos de autor e direitos conexos, principalmente, a fim de responder à evolução da tecnologia e do mercado. (…) Entre outras coisas, tanto o WCT quanto o WPPT forma feitos para enfrentar os desafios colocados pelas tecnologias digitais de hoje, em particular a difusão de material protegido por redes digitais como a Internet. Por esta razão, eles são frequentemente referidos como os “tratados da Internet”.

No Brasil, com o Marco Civil da Internet, temos somente o artigo 19, §2º, citando os direitos autorais. Segundo esse artigo:

Art. 19.  Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. § 2º A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5o da Constituição Federal.

Um dos casos célebres envolvendo direitos autorais e internet envolve o site Pirate Bay, que funciona por meio do modelo de compartilhamento de arquivos na internet, disponibilizando-os para download por meio do sistema P2P, em que não há atuação de um servidor. Os arquivos são compartilhados por outros usuários, chamado ¨peers¨ – normalmente utilizando o BitTorrent.

O site em questão permitia download de filmes, músicas, jogos, softwares entre outros, mas não armazenava nenhum material e nem obtinha lucro por meio do download, e sim pela publicidade (quase 70.000 dólares mensais), por isso, alegavam não infringir os direitos autorais por nenhum conteúdo de proteção de copyright ser armazenado no site, não sendo teoricamente responsabilizados pelo material vinculado. Mas não seriam eles cúmplices por facilitarem o intermédio dos compartilhamentos?

O campo de discussão relacionando os direitos autorais e a internet é vasto, pois esses direitos são constantemente reinterpretados para se adaptar ao mundo imaterial trazido pela rede. Debates como o dos Creative Commons, a consulta pública promovida do governo brasileiro sobre direito autoral no ambiente digital, dentre outros, serão cada dia mais presentes não só no meio acadêmico como também, e principalmente, no nosso cotidiano.

Sobre os autores

Letícia Alves Vial é graduanda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. É integrante do Grupo de Estudos Internacionais em Internet, Inovação e Propriedade Intelectual (GNet) . Tem como áreas de interesse em pesquisa: Propriedade Intelectual, Direito e Inovação, Direito Internacional Privado e Direito Internacional Público. Atualmente estagia em escritório de advocacia especializado em Propriedade Intelectual e Direito do Terceiro Setor.

Marcos Henrique Costa Leroy é bacharelando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pesquisador-bolsista do Grupo de Pesquisa em Direito Econômico (GPDE) e pesquisador do Grupo de Estudos Internacionais em Internet, Inovação e Propriedade Intelectual (GNet), ambos da FDUFMG. Estudou na Université de Lille II – Droit na França temas como Direito Autoral, Analise Econômica do Direito e Análise Econômica do Crime e Delito. Atualmente estagia no Ministério Público Federal na área criminal.

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