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Como advogar em propriedade intelectual na era da informação

Escrito por

7 de julho de 2016

André Costa Belfort

A chamada revolução digital serviu como momento que sinalizou o fim da era industrial e início da famosa ‘era da informação’. Entretanto, a maioria dos sistemas de proteção de propriedade intelectual foi pensada e desenhada exatamente para a realidade da era industrial. Como, então, advogar para empresas inseridas na era da informação em questões ligadas a um sistema típico da era industrial? Embora cada caso seja único, vamos tentar listar algumas considerações que podem ajudar o advogado (e o cliente) a sobreviverem em um mercado tão dinâmico.

A prioridade é sempre a necessidade do seu cliente

Quando estamos diante de um sistema burocrático – como o de marcas e patentes, por exemplo – é muito tentador buscar adequar a realidade ao direito. Quando cedemos a essa tentação, ignoramos os problemas e a realidade do cliente, insistindo que ele se enquadre em soluções pré-moldadas que nem sempre resolvem o seu problema.

A atuação do cliente dentro do permitido pela legislação é essencial? Sim, claro – sempre. Mas ‘matar’ o seu cliente para que ele se conforme aos requisitos legais, ficando cego às suas necessidades, não é ser advogado. Conciliar as duas coisas – a necessidade do cliente com as possibilidades legais – é o que faz um advogado bom, muito mais do que o simples conhecimento jurídico.

Pense além da burocracia

No paradigma industrial, talvez fosse viável esperar anos pelo registro de uma marca, ou quase uma década pela concessão de uma patente. Não era bom, mas era viável. Na era da informação, qualquer quantidade de tempo é exponencialmente potencializada. Por isso, não se limite a raciocínios binários como ‘isso vai demorar tantos anos’, e se esconda atrás da burocracia estatal.

Lembre-se que pedidos (mesmo que ainda não concedidos) carregam uma série de expectativas de direito. Com a devida diligência prévia (due diligence), um profissional experiente pode estimar riscos e probabilidades em algum grau. Então não jogue a responsabilidade para o Estado – faça seu trabalho, ofereça opiniões fundamentadas, e deixe seu cliente saber que, mesmo diante de uma estrutura ineficiente, você está tomando conta dele. É para isso que ele paga o advogado.

Lembre-se do poder dos contratos

Qualquer estudante de direito lembra dos requisitos básicos de um contrato: partes capazes, objeto lícito, forma prescrita ou não defesa em lei. Mas um contrato vai muito além disso.

O desenho de uma solução jurídica sempre parte de dois limites: o que o cliente precisa, o que o direito permite. E é por meio de contratos que, quando estiver diante de mais de uma parte, você pode estruturar como a relação vai acontecer, dentro daqueles limites.

Pode parecer senso comum, mas uma grande quantidade de problemas seria facilmente evitada se as pessoas envolvidas se dessem ao trabalho de formalizar, contratualmente, o que parece acordado de forma verbal ou informal.

No caso da Propriedade Intelectual, isso tem um peso ainda maior quando lidamos com Direitos Autorais. Se a Propriedade Industrial (marcas e patentes) parece um tanto engessada em estruturas burocráticas, o sistema estabelecido pela atual Lei de Direitos Autorais dá ao advogado muita flexibilidade para o desenvolvimento de instrumentos contratuais. Use essa flexibilidade.

Tenha em mente o papel do risco

Em um paradigma industrial, é muito comum que cada parte queira ficar completamente isenta de riscos. Ou o poder econômico, ou equipes jurídicas enormes e caras, vão garantir que esse risco seja diferido, anos a fio, em discussões judiciais. Na era da informação, o risco anda de mãos dadas com a atividade empresarial. Se a grande preocupação do advogado costuma ser evitar riscos, a atividade do empresário é exatamente administrar riscos, alavancar riscos. E isso é ainda mais importante em empresas inseridas em um ambiente extremamente dinâmico e inovador.

Quando tratamos de Propriedade Intelectual – que, em regra, tem um custo quase zero de reprodução – é essencial saber administrar os riscos, junto com o seu cliente. Saber a hora de fazer um termo de confidencialidade (NDA – Non-Disclosure Agreement), ou de estabelecer multas em contratos, pode ser crucial para o sucesso (ou fracasso) do negócio do seu cliente.

Desenvolva parcerias

Mais uma sugestão que não é específica para a realidade da era da informação, mas é bastante crucial, é desenvolver uma relação de parceria com o seu cliente. Pode parecer algo vindo de um livro de auto ajuda empresarial, mas é verdade: se você acha que o seu cliente só serve pra te tirar a paz e pra preencher os dados da nota fiscal no fim do mês, tenho uma péssima notícia pra você.

Não existe mais espaço para o advogado distante e despreocupado, que apenas atende ao cliente de acordo com a sua disponibilidade e faz o mínimo. Você precisa conhecer o negócio do seu cliente a fundo, e sentir o sucesso dele como o seu sucesso – só assim você irá se preocupar, de verdade, em desenvolver as melhores estratégias e soluções, ao invés de simplesmente oferecer as mesmas respostas e modelos de sempre.

Valorize seu trabalho

Um dos maiores riscos para qualquer profissão é não ter seu valor reconhecido. Se você acha que seus clientes não te valorizam é, muito provavelmente, porque você também não valoriza eles. Se você souber identificar as necessidades do cliente, cuidar dos seus bens intangíveis mais valiosos (estamos falando em Propriedade Intelectual, afinal de contas) e ser parceiro dele, pode ter certeza que seu valor será reconhecido.

Algumas das dicas aqui podem se aplicar para vários outros mercados ou outras áreas do direito. Mas na Propriedade Intelectual, principalmente com as dificuldades específicas que a área impõe, alguns desafios são acentuados. Na maioria dos casos, startups ou empresas muito inovadoras não conseguirão ter suas necessidades de Propriedade Intelectual atendidas com soluções pré-fabricadas, do tipo ‘modelo universal’. A única forma de criar estratégias de proteção de ativos intangíveis é conhecendo e pensando como seu cliente.

Na era da informação, um advogado pode ser um problema, um ativo estratégico, ou uma commodity. Cabe a você determinar qual a posição que quer ocupar.

Sobre o autor

André Costa Belfort é Mestrando e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Especialista em Propriedade Intelectual e Inovação pelo CEAJUFE / Universidade de Itaúna. Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Direito Econômico (GPDE) da FDUFMG. Advogado na Belfort & Moreira Advogados. E-mail: andrecbelfort@gmail.com

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